sábado, 12 de abril de 2008

Livro Quarta-feira, Editora Record - 1998

Mário Prata


Certos enganos
Eric Nepomuceno

Além de um talento imbatível e quase absurdo para o piano, Arthur Moreira Lima tem outro: criar e armazenar frases definitivas. Certo dia de irada melancolia, ele queixou-se num longo telefonema:

- Tem coisas que só acontecem com o Fluminense e comigo!

Bem que poderia ter esclarecido: “Com o Fluminense, comigo e com o Rio de Janeiro.”

O aniversário de Chico Buarque em pleno mês de novembro, e que fechou o trânsito no final do Leblon, é uma dessas histórias da cidade.

Sem que ninguém saiba ao certo como é que tudo começou, o dramaturgo Mário Prata estava numa mesa do Final do Leblon tomando uma cerveja preguiçosa com Chico Buarque. E queixava-se:

- Sou o sujeito mais desafinado da história da humanidade.

Discreto, Chico tentou um consolo:

- Não seja exagerado.

Pratinha insistiu:

- Você fala assim, com esse ar superior, porque não sabe o que eu sofro. Desafino sempre, em qualquer ocasião: no chuveiro, no trânsito, cantando para dentro quando quero lembrar alguma velha canção... Não adianta, desafino o tempo todo. Na escola, era um horror: festa do Dia da Pátria, do Dia do Mestre, do Dia da Proclamação, uma desgraça. Eu abria a boca e sentia que todo mundo começava a rir em volta.

Chico insistiu:

- Ora, todo mundo desafina, tirando, é claro, o João Gilberto e a Gal...

Para Mário Prata, a indiferença do amigo tornou-se insuportável. Fez então a confissão derradeira:

- Chico, eu desafino até em festa de aniversário. A criançada ri, maldosa, minha filha chora de vergonha, meu filho me fulmina com os olhos assim que começo o “Parabéns...”.

Chico achou que aquilo havia passado dos limites, quis verificar. Pediu:

- Isso, eu quero ver. Canta, mas seja honesto: se desafinar de propósito, eu percebo. Mário Prata se concentrou: mãos crispadas, olhos fechados, lançou à meia-voz:

- Parabéns pra você... nessa data querida...

Tomou fôlego numa breve pausa e, sem abrir os olhos, foi adiante:

- Muitas felicidades... muitos anos de vida...

Extasiado, Chico sorriu e admitiu: incrível, ele havia desafinado mesmo!

Mas nem teve tempo para o comentário: num instante explodiram nas mesas vizinhas os gritos de “Viva, viva!”, e mais os aplausos, e imediatamente, sem que pudesse explicar nada, ele foi coberto de abraços, cumprimentos calorosos e um coro repetindo o que Mário Prata destroçara com sua inacreditável desafinação. O dono do bar bradou uma inédita rodada por conta da casa. Quem passava pela calçada somou-se à festa e, no meio da confusão, Mário Prata apoderou-se do telefone e começou a convocar os amigos para o aniversário de Chico Buarque no Final do Leblon. Aproveitou para convocar alguns jornalistas e também as moças que voltavam da praia e espiavam, curiosas.

Alguém ligou para a casa do aniversariante para confirmar o local da festa e acabou convencendo uma atônita Marieta a ir rapidamente até o Final do Leblon levando as crianças e, claro, o indispensável bolo com as velinhas.

Uma hora depois, a festa havia tomado conta da rua Dias Ferreira. Um guarda desviava o trânsito, fotógrafos tratavam de descobrir celebridades, e moçoilas querendo se fazer passar por repórteres tentavam descobrir quantos anos Chico estava fazendo. Houve quem levasse presentes, e um repórter francês gravou declarações exclusivas que transmitiu dali mesmo, pelo telefone do bar, para o seu jornal em Paris.

Pouco depois das nove e meia o aniversariante foi embora ao lado da mulher, das filhas e, claro, de Mário Prata. A festa continuou noite adentro.Ninguém parecia dar a menor importância para o fato de Chico Buarque ter nascido num dia 19 de junho e aquilo tudo estar acontecendo em pleno mês de novembro. Porque no Rio de Janeiro, é assim: não importa o dia em que você nasceu; qualquer dia é dia, qualquer hora é hora para comemorar alguma coisa - até mesmo um aniversário que não aconteceu. (1994)

sexta-feira, 11 de abril de 2008

O Pasquim - 31 de agosto de 1969


Um lugar ao sol

Chico conta a longa luta de um brasileiro em Capri querendo um lugar ao sol.

O vosso correspondente em Roma não se encontra em Roma. Em Roma não há ninguém. Fugiram todos à praia em gozo de sol e férias. Sigo a multidão com minha tenda, meu trapézio e meus leões. Essa é a vida de artista, correr onde está o público para poder fingir que é o público a nos correr atrás. Dia desses baixei em Capri, que segundo o cicerone, ostenta as praias mais lindas do mundo depois do Rio de Janeiro. Comovido, agradeci, dobrei a gorjeta e fui conferir. Realmente o azul do mar, com as rochas brancas e a mata cheirosa, é um espetáculo único. Mas ir à praia, aí é que são elas. Convenci-me de que brasileiro não sabe tomar banho de mar, e olha que tive o maior empenho em aprender.
- Paga-se a entrada!! Pois não. Paga-se o vestiário? Pois não. O mictório também? Não tem problema.
Entrada, vestiário, mictório, guarda-sol, cadeira, bóia, desci à praia cheio de tickets e privilégios. Irrepreensível, pensei. Agora que descobri os macetes é só deitar na areia, comprar um chica-bom e pensar besteira, igual a Copacabana. Mas qual não foi minha surpresa quando cheguei à areia (pedregulhos) e a encontrei literalmente repleta de cabeças, pernas, barrigas e bumbuns. Tentei abrir caminho, pedi um passinho à frente, por favor, disse que ia saltar no próximo ponto, mas os corpos estavam surdo-moles no mormaço. Recuei alguns metros, pisei nas partes duma senhora e subi os degraus de volta. Lá em cima, sobre o cimento, havia um colchão de ar jogado à toa. Deitei e ameacei um cochilo, mas o bilheteiro balneário veio perguntar em inglês se eu era da família americana. À minha primeira pronúncia ficou evidente que eu não era não de tão boa família, diante do que fui convidado a me retirar do colchão esplêndido. Nisso me revoltei bradando que queria um lugar ao sol, queria um lugar ao sol, frase que aprendi nos bastidores da televisão. Na minha terra, insisti, a praia é do povo como o céu é do condor.
- Mas aqui o colchão é dos americanos - disse o bilheteiro friamente.
Eu não ia discutir, ainda mais que os americanos tinham acabado de invadir a lua, uns dias antes. Eu não ia discutir por causa dum colchão de ar. Não discuti mas fiquei com aquilo atravessado na garganta, por isso fui até o bar para engolir melhor. Uma droga dum colchão de ar. Sentei no bar e fiquei vendo os americanos prostrados ao sol. Pareciam cada vez mais bonitos, saudáveis, bronzeados, e eu muito cinzento e verde. Assim passavam-se as horas e nada de vagar um só buraquinho. Pelo contrário, chegavam sempre novos banhistas, desses gordos, sem ossos, gelatinas. Iam falando please e acabavam se encaixando. O aglomerado já formava uma massa tão comprimida que dali a pouco, com mais um aperto, dava a impressão que uns e outros iam estourar para o alto que nem pipoca. E quando alguém se levantava, deixava sempre um chapéu para garantir a vaga. Às cinco e meia resolvi desistir, mas aí abriram um primeiro espaço. Saiu um, saíram dois, saí eu e corri a reservar meus pedregulhos. Sobrou uma cadeira, tomei conta. Apossei-me duma bola, dum colchão, dum guarda-sol, tudo junto. Afinal eu tinha os tickets, estava no meu direito. Só achei estranho aquele êxodo assim precipitado, pois em poucos minutos eu estava sozinho na praia. Engraçado, porque americano não é de abandonar um bom lugar sem mais nem menos. Que diabo, se eles foram embora é porque algo de ruim vem por aí. Pensei em chuva, tempestade, tubarão, mas nada. Só os bilheteiros que estavam recolhendo tudo, o bar que estava fechando, o último ônibus que estava partindo e eu que estava sendo expulso. Expulsão não é bem a palavra, não é exata. Mas ficam aqueles garçons resmungando e olhando para a sua cara. E vem aquele empregado mandando você erguer os pés, os dois ao mesmo tempo, para passar o escovão debaixo. Como boteco de português à meia-noite. Que é isso, perguntei, vai fechar a praia? Pois é claro, disse o empregado, às seis horas nós fechamos tudo. E continuou a esfregar sabão na praia. Não era o caso de contestar a organização lá deles, mas confesso que fiquei perturbado. Ainda mais quando, ao deixar o local, olhei para o mar e vi o que vi. Aliás, não sei se vi mesmo, é difícil acreditar. Vai ver que o sol me batera na cabeça de mau jeito. Ou então fora o gin, sei lá, gin é uma bebida desleal. Não posso jurar nem peço que me creiam, mas o que vi foi o seguinte: o mar esvaziando, esvaziando, os barcos acomodando-se entre as pedras e o Mediterrâneo sendo chupado pelo ralo, dando lugar a magníficas auto-estradas, caminhões, ferrovias, semáforos, supermercados, perdendo-se de vista no horizonte.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

HUMOR

O sujeito conhece uma garota na noitada e logo a leva para o motel. Lá ele tira a camisa, deixa o bíceps à mostra e diz:
- Isso são 80 quilos de dinamite!
Mostra o abdome e diz:
- Cem quilos de dinamite!
Depois, tira a bermuda, mostra as coxas e diz:
- Cento e vinte quilos de dinamite!
Enfim, tira o samba-canção e a mulher sai pelo corredor gritando:
- Evacuem o motel! Meu quarto está lotado de dinamite e o pavio é curtinho!


*****************************************

Ao chegar mais cedo em casa, o marido encontrou a mulher nua na cama, prostrada, respirando ofegante.
- O que houve, querida? Você não está passando bem? – perguntou preocupado.
- Acho que é um ataque do coração – respondeu ela.
Ao ouvir isso, o marido correu feito um louco para o telefone a fim de chamar um médico. Enquanto tentava discar, o filho chegou perto dele e avisou:
- Paiê, tem um homem pelado no banheiro.
O marido foi até lá, abriu a porta e deu de cara com seu melhor amigo. Ficou indignado:
- Pelo amor de Deus, Alfredo! Minha mulher está tendo um enfarte e você fica por aí assustando as crianças!

*****************************************

Zé viu a mulher de seu melhor amigo entrando em casa com outro e foi correndo avisar:
- Pedro, corre que sua mulher acaba de entrar em casa com outro.
O Pedro corre desesperado e, depois de meia hora, volta e briga com o amigo.
- Zé, quer me matar do coração? Minha mulher não está com outro. Aquele é o mesmo de sempre.

*****************************************

P: Você sabe qual a diferença entre a lagoa e a padaria?
R: Na lagoa há sapinho, e na padaria, assa pão.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

QUARTA POÉTICA - EUCLIDES DA CUNHA


COMPARAÇÃO

"Eu sou fraca e pequena..."
Tu me disseste um dia.
E em teu lábio sorria
Uma dor tão serena,

Que em mim se refletia
Amargamente amena,
A encantadora pena
Que em teus olhos fulgia.

Mas esta mágoa, o tê-la
É um engano profundo.
Faze por esquecê-la:

Dos céus azuis ao fundo
É bem pequena a estrela...
E, no entanto - é um mundo!


A FLOR DO CÁRCERE

Nascera ali - no limo viridente
Dos muros da prisão - como uma esmola
Da natureza a um coração que estiola –
Aquela flor imaculada e olente...

E ele que fôra um bruto, e vil descrente,
Quanta vez, numa prece, ungido, cola
O lábio seco, na úmida corola
Daquela flor alvíssima e silente!...

E - ele - que sofre e para a dor existe –
Quantas vezes no peito o pranto estanca!...
Quantas vezes na veia a febre acalma,

Fitando aquela flor tão pura e triste!...
- Aquela estrela perfumada e branca,
Que cintila na noite de sua alma...

terça-feira, 8 de abril de 2008

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Expressões Populares - significado e histórico

SAIR À FRANCESA

Significado: Sair de uma festa ou cerimônia sem se despedir.

Histórico: Pode ter origem em costume francês ou na expressão “saída franca”, indicando mercadorias sem impostos, que não precisam ser conferidas. Como os franceses primam justamente pela etiqueta, não concordaram com a frase e a mudaram para “sair à inglesa”. Alguns pesquisadores situam o surgimento da expressão na época das invasões napoleônicas na Península Ibérica (1810-1812), mas o escritor português Nicolau Tolentino de Almeida (1740-1811), cuja poesia satírica visava aos usos e costumes de Lisboa, registrou-a muito antes nestes versos: “Sairemos de improviso/ despedidos à francesa”.

FICAR A VER NAVIOS

Significado: Ficar sem nada.

Histórico: Dom Sebastião, rei de Portugal, havia morrido na batalha de Alcácer-Quibir, mas seu corpo nunca foi encontrado. Por esse motivo, o povo português se recusava a acreditar na morte do monarca. Era comum as pessoas visitarem o Alto de Santa Catarina, em Lisboa, para esperar pelo rei. Como ele não voltou, o povo ficava a ver navios.

PÔR EM PRATOS LIMPOS

Significado: Metáfora na resolução de conflitos.

Histórico: O primeiro restaurante foi aberto na França em 1765. Estabeleceu-se desde o início que a conta seria paga após a pessoa comer, ao contrário do que depois veio a acontecer com os lanches rápidos. Quando o dono ou o garçom vinha cobrar a conta e o cliente ainda não havia feito a sua refeição, os pratos limpos eram a prova que ele nada devia.

DEIXAR AS BARBAS DE MOLHO

Significado: Ficar de sobreaviso, acautelar-se, prevenir-se.

Histórico: Na Antigüidade e na Idade Média a barba significava honra e poder. Ter a barba cortada por alguém representava uma grande humilhação. Essa idéia chegou aos dias de hoje. Um provérbio espanhol diz que “quando você vir as barbas de seu vizinho pegar fogo, ponha as suas de molho”. Todos devemos aprender com as experiências dos outros.

CHORAR AS PITANGAS

Significado: Chorar muito.
Histórico: O nome pitanga vem de pyrang, que, em tupi, significa vermelho. Portanto, a expressão se refere a alguém que chorou muito, até o olho ficar vermelho.