terça-feira, 22 de abril de 2008



SAINDO PELA BOCA DO EDU LOBO .....
E CHEGANDO PELOS OLHOS DO PAUL McCARTNEY!

por Marly Spacachieri

Lá estamos nós cantando as músicas classificadas. Anos bons, letras e melodias boas, clima político terrível. Tento ter cabelos longos porque são lisos, mas, sempre e sempre mais, aparece a tesoura da arte de cortá-los, sob o pagamento dos meus pais e fico eu com uma risca do lado esquerdo e um topete – quase franja – na testa. Pescoço? Descoberto. Liso demais, esse cabelo! A Elis Regina usava um igual e a Rita Pavone, italianinha, também. Então, tudo resolvido. Nada de cabelos longos. Não tem que reclamar, menina!

A escola é técnica e eu e ELA carregamos nossos livros de contabilidade para cima e para baixo. ELA mora perto! Eu moro mais ou menos perto! A música está presente porque ELA estuda piano e eu me apaixono perdidamente por Tchaikovsky em seu Concerto número 1 para piano e orquestra. Correm os anos da década de 60, meio dela, indo para o fim. Festivais da música brasileira.

As letras das músicas recortadas da revista Intervalo. Tem fotos dos artistas. Edu Lobo é um moço alto, magrinho, desengonçado com as mãos, sorridente com dentões brancos, fumando muito e blusa de gola role embaixo de um paletó. Modelo bom moço. Não agrada a “tchurma da jovem guarda” porque a “brasa, mora” é usar cabelos longos, roupas multicoloridas e um andar gingado, descarado, meio vou-mas-não-muito. Canta bem, o rapaz. Toca violão, coisa de gente meio suspeita. E tem olhos grandes. ELA se encanta, se apaixona, verte lágrimas. Ele mora no Rio de Janeiro. ELA recorta as fotos e as guarda dentro dos meus livros de contabilidade. Os pais dELA não querem paixões que não sejam as clássicas. Lá vou eu carregando Edu Lobo encostado no meu futuro seio direito. Todos os dias ele, Edu Lobo, sai de lá e corre como figurinha para as mãos da amada desconhecida, que o beija entre lágrimas.
Assim se canta Ponteio, ainda que com um ciúmes daquela mocinha magricela que ficava ao lado dele! Bonita? Nããããão! Bonitinha. Só. Cigarros escondidos, chicletes e até perfume esfregado nos dentes. Muitas lágrimas. Vontade de morrer diante de tanta dor. Dor de ter sido abandonada sem nunca ter tido. Imaginação do beijo, da boca na boca. Suspiros e eleição do “Soneto” de Camões como o bálsamo para o sofrimento imenso. Filmes românticos e brigadeiro comido na panela entre goles de guaraná. Muita tristeza. Vontade de fugir ou de morrer!

Um socorro! Um Help! Aquele rapaz é algo como sensacional. Tem cara de anjo, triste como só um deles pode ser. Canta macio. Sorriso comedido. Cabelos quase longos. Guitarra, instrumento do demo! Grita por socorro! Nosso canto? Desculpa para aprender o inglês, é mais fácil assim, fica retido na memória, pai! Coisa boa. E os lábios? E a boca? Suspense dELA na descoberta do novo sentimento. Mora mais longe que o do Rio. Inglaterra? England, sir! The table, the cat, the dog, I love you! The Wolf? Go home! ELA? Novos caminhos e mesmos suspiros. Agora? Sonetos embriagantes de Shakespeare. Outros cigarros com brigadeiro. Fotos recortadas para dentro dos meus livros de contabilidade. Será que brigarão? Dois autênticos cavalheiros? Espadas? Luvas de desafio de duelo? HELP! Viro heroína anônima, tiro as fotos do Lobo/Wolf e coloco no meu diário. Ficam lá até quando as encontro durante a faxina anual do armário. O brilho desses olhos, ao vivo, hoje, é o mesmo. O cabelo –menos - ainda liso, teima em cair no rosto. A sua música toma caminhos maravilhosos. Quanto à boca do Paul, sei não! Não acho nenhuma foto dele! ELA? Casou-se, teve filhos e só canta as coisas de Deus. Eu? Tenho cabelos longos e nenhum topete. Não canto nada. Ouço muito, anoto tudo e transcrevo o que posso sobre os lobos.

3 comentários:

Anônimo disse...

Ô Marly que belezura de texto, sabe que eu me peguei imersa numa sensação inusitada,de personagem vindoura!,preconizada';quiçá regreessiva,retroativa rss.Eclodiu uma tal nostalgia dúbia,uma minha,outra(s) ANÔNIMA(S),uma simbiose saudosista,futuro-passado,passado-futuro,de quem está vivendo, atrasada', a paixão de outrora no presente,encantada com os mesmos negros(BELOS!)olhos do mesmo Lobo,uma urdida saudade do que não existiu,uma empatia' com essas pequenas loucuras juvenis-remanso,às minhas dantes,passadas a pouco (!).
A propósito acumulo os recordos no HD,sem tesoura,diário,mas a mesma vêemencia,polidez e intensidade que resume essas paixões platônicas.Num emblemático futuro eu quero resgatar essa mesma intensidade,num esquecido JPEG (!).Bj grande...(Larissa-Lay)

BIM disse...

Obrigada, Larissa-Lay. Resgate tudo sim, e mais um pouco, pois é dessa forma que partilhamos as emoções e vivências com os outros.

" Sobre Todas as Coisas" disse...

aê Marly
só faltou o laquê nos cabelos...rs
me lembrou dos bailes com luz negra, " Je t'aime", Ray Connif,
Elvis...
Muito bom...
escreva mais, mais, mais....

beijão !!!