segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Depoimentos sobre Chico Buarque - 005

Zuenir Ventura

Release da Polygram para o LP Meus caros amigos – 1976


Ele não é apenas um extraordinário artista popular. É o mais significativo gesto cultural deixado pela geração que por volta de 1964 tinha 20 anos e começava a aparecer.

De todos eles, compositores e cantores, Chico foi quem melhor soube aproveitar as dificuldades e desafios de uma época para instaurar uma estética, elaborar uma estilística e forjar uma estratégia próprias para, com elas, construir uma obra que, pela qualidade e pela quantidade, dificilmente encontra paralelo mesmo nas outras artes do país.
(...) Do Tropicalismo até os dias atuais, a nossa cultura perdeu-se em desvios, freqüentou vazios e desceu aos subterrâneos da irracionalidade e da evasão. Muitos não resistiram. Sem ser o único, Chico no entanto será talvez o mais completo símbolo de resistência desses tempos. O que lhe custou essa luta em defesa da dignidade de seu canto, só seus silêncios forçados podem dizer. (...) O que Chico rejeita, com base na sua experiência presente, é o voluntarismo apressado e onipotente. A este, ele opõe a lucidez de quem sabe que cada um age segundo suas possibilidades e de acordo com as ferramentas de que dispõe - no seu caso a canção. (...) Chico não é o cantor de promessas vãs, mas o firme cantor da esperança. Talvez por isso a sua estratégia de resistência cultural, mesmo reconhecendo as próprias limitações, não se tenha conformado em aceitar a tentação quietista de uma “estética do silêncio” ou do “viez” ou do “desvio” ou da “omissão” ou da “adesão”, que estiverem tão em moda. Em lugar destas e no estreito espaço que lhe restou, ele criou uma “estética do possível” capaz de, em tempos de interdição, construir uma obra que resiste a qualquer tempo. Conjugando alguns dos mais ricos encontros já havidos entre poesia e melodia - Construção, Olê, Olá, Roda Viva, Noite dos Mascarados, Tem mais Samba, Sonho de um Carnaval, etc, etc.- a obra de Chico tem tantos momentos de genialidade, que se descobre ser ela sozinha uma antologia da nossa música popular.

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